O BD faz envio de
DIVULGAÇÃO: COMUNICAÇÃO AOS EURODEPUTADOS SOBRE A GOVERNAÇÃO E DIREITOS HUMANOS EM ANGOLA PELO ACTIVISTA JOSÉ MARCOS MAVUNGO
O Bloco Democrático - BD recebeu a comunicação e faz agora o seu apoio contribuindo para a sua divulgação na íntegra:
Exmos Senhores
Vimos pela presente informar-vos de que fui recebido hoje, 11 de janeiro de 2017, pela Subcomissão dos Direitos Humanos do Parlamento Europeu, em Bruxelas, a convite da Eurodeputada, Ana Gomes. A discussão foi à volta da problemática da governação e dos direitos humanos em Angola, em particular em Cabinda.
A reunião aconteceu na sala Altiero Stinelli A1E1, onde estiveram presentes várias entidades do Parlamento Europeu, entre as quais os deputados José Inácio Faria, de Portugal, e Cecília Kyenge, da Itália. Abrindo o encontro, Ana Gomes explicou que o Parlamento Europeu tem “muito interesse em receber o activista José Marcos Mavungo, tendo em conta a actual situação vigente em Angola”.
Junto envio em anexo a minha comunicação no encontro tido hoje com os Euro parlamentares. Queiram fazer larga difusão desta comunicação.
Atenciosamente
José Marcos Mavungo
Activista dos Direitos Humanos/Human Rights Activist
Bairro a Victória é Certa - Móvel – 923 715 896/995 169 348
jomavungo@yahoo.com.br
CONTEÚDO:
Comunicação aos Eurodeputados em Bruxelas, aos 11 de Janeiro de 2017
Tema: "Governação e dos Direitos Humanos em Angola."
Orador: José Marcos Mavungo
(Activista Cívico dos Direitos Humanos e membro da Sociedade Civil de Cabinda)
Ilustres Euro parlamentares,
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Permitam-me
desde já saudar e agradecer a Eurodeputada da Subcomissão dos Direitos
Humanos do Parlamento Europeu, Dra. Ana Gomes por me ter convidado para
expor neste lugar a situação da Governação e dos Direitos Humanos em
Angola. Devo confessar que me sinto simultaneamente humilde e elevado
por esta honra e privilégio.
Quando
recebi este convite, decidi aceitá-lo em consciência porque achei que,
enquanto ativista dos Direitos Humanos e cidadão do mundo, faltaria ao
meu dever ao não me pronunciar sobre assuntos que nos dizem respeito a
todos, no quadro de uma assembleia tão importante como esta. É neste
estado de espírito, de cidadão independente do político, que vos falarei
abertamente do que se passa neste momento em Angola.
Ilustres Euro parlamentares, Minhas Senhoras e Meus Senhores,
Quando
os arquitetos do fim da Segunda Guerra Mundial redigiram as admiráveis e
sábias palavras da Declaração Universal dos Direitos Humanos e dos
povos, assinaram uma nota promissora para o futuro da humanidade. Nesta
nota está bem patente o compromisso de que a todos os homens e povos
deveriam ser garantidos os direitos inalienáveis da vida, liberdade, paz
e desenvolvimento. E os governos, que hoje têm assento nas Nações
Unidades, entre eles Angola, ratificaram esta Declaração.
Porém,
é hoje óbvio que Angola, seria absurdo e irresponsável negá-lo, está a
passar pela experiência duma vida sociopolítica em que o cidadão, na sua
a participação na vida da “polis”, se confronta com um Estado
autoritário. O país está exposto a “propósitos de rapina”, sustentados
por um autoritarismo e despotismo feudal.
A classe política dominante restruturou-se numa lógica de partido em que os militantes se converteram em «ghetto despótico económico»: criou-se um poderoso grupo fechado a que só têm acesso os magnatas do regime, que são os senhores absolutos do crédito, e por isso dispõem do sangue de que vive toda a economia nacional e de tal maneira a manejam, que ninguém pode respirar sem a sua licença. Os de fora são considerados como vassalos – limitam-se a servir os detentores do poder docilmente, como se fossem
vassalos, e sem estatuto de cidadãos.
Por
esta razão, as instituições em Angola funcionam bastante mal, e o país é
conduzido por uma estranha lógica de governação, que ignora a dimensão
humana do cidadão. A política económica caracteriza-se por um modelo de
desenvolvimento que redistribui a riqueza para cima e para fora, sob o
controlo da classe política dominante, acabando assim por ser
instrumento de mais intensamente afligir os aflitos, os pobres.
Esta
situação está estreitamente ligada aos quase 30 anos de guerra civil,
que devastou as estruturas e o tecido social e económico do país, e ao
conflito ainda reinante em Cabinda, que se inscreve no quadro do direito
dos povos a disporem de si mesmos. A lógica da guerra estendeu-se no
tempo, por todas estas quatro décadas, e estabeleceu-se uma forma de
vida sociopolítica adaptada a ela.
Por
isso, as instituições democráticas saídas há pouco da destruição e da
guerra funcionam num meio hostil – a caminhada para a democracia e
Estado de Direito encontra-se num empasse com posições defensivas e
militaristas, ausência de transparência e da cultura da Lei e a
existência de pretextos incoerentes para perseguir, prender e condenar
ativistas dos Direitos Humanos.
Além
disso, as condições para eleições livres e justas não existem em
Angola, sendo os detentores do poder os senhores absolutos, que
controlam a administração e todo o dinheiro do país, manipulam a lei e
os meios de comunicação social e erguem muros para conter as iniciativas
cívicas dos cidadãos. Hoje em dia, a vontade da classe política
dominante se institucionalizou no quotidiano, e a governação acabou por
dar-se a um pragmatismo partidocrático, no qual justiça e injustiça são a
mesma coisa, contanto que sirvam os interesses das individualidades e
do partido no poder.
Portanto,
a sobrevivência do partido no poder acabou por dar-se a qualquer custo,
ainda que não seja conforme aos valores humanos e universais:
assassinato, corrupção, fraude eleitoral, repressão e restrições para
com os ativistas dos direitos humanos e as populações autóctones, em
especial em Cabinda, nas Lundas e no Gambos. Trata-se de uma pejada de
injustiças e crimes inauditos, nos quais estão envolvidos até elementos
das instituições da administração da justiça.
Ilustres Euro parlamentares, Minhas Senhoras e Meus Senhores,
Cabinda é o mais célebre território, o pólo da ferocidade do despotismo reinante em Angola, com uma Governação própria a Estados colonizados de tipo feudal, que não permite aos Cabindas fazer qualquer reclamação ou organizar-se em associações de defesa dos direitos humanos, vigiados em todas as suas acções pelos agentes dos Serviços de Inteligência e Segurança do Estado (SINSE) e pela Contra Inteligência Militar (GOISM) – sem direitos nem peso nas decisões sobre a sua terra, entre gritos e gemidos de dor, pobreza e doença, abuso de poder e clientelismo, corrupção e deficiência dos serviços administrativos, assassinatos e perseguições republicanas, detenções arbitrárias e julgamentos injustos.
Referindo apenas alguns exemplos típicos e flagrantes que vemos em Cabinda:
- Política fascizante e militarista que se fecha sobre si própria com um programa visando acabar com o conflito ainda reinante no território de Cabinda pela repressão e via armada. É assim que o crime tornou-se a forma por excelência da governação em Cabinda, cidadãos indefessos são vítimas de horrores e perversões comportamentais de elementos das Forças Armadas Angolanas (FAA) e da Polícia Nacional (PN).
Ao
mesmo tempo, temos: o sistema judiciário muito débil, refém de
instintos políticos e militares; os impedimentos à imprensa independente
de instalar-se em Cabinda; os entraves aos jornalistas estrangeiros em
visitar Cabinda; e os ativistas dos Direitos Humanos a serem presos sob
pretexto de atentarem contra a segurança do Estado. Deste modo, o regime
jura fabricar a paz artificialmente, sem ingredientes necessários: sem
valores humanos, sem Cidadania da Liberdade, e sem Justiça para o povo
de Cabinda.
- Ausência de políticas e estratégias de desenvolvimento sustentável, descoordenação e anarquia nos programas de gestão dos recursos naturais do território e debilidade das infraestruturas sociais e económicas. Esta situação é agravada pela fragilidade da estrutura empresarial local que, descapitalizada por razões políticas, não consegue fazer face à competição das empresas das outras províncias e das multinacionais sediadas em Cabinda.
O
desenvolvimento de Cabinda tão propalado pelo regime não passa de
declaração de intenções. Declaração de intenções que fazem anúncio do
dia em que as populações, em toda a extensão territorial de Cabinda,
terão água, luz, gaz, Porto de Águas Profundas, Parque Industrial,
grandes centralidades e todos os cuidados preventivos, curativos e
paliativos para conservar um estado de bem-estar físico, mental e
social.
- A instabilidade laboral e social e a subsequente exclusão e miséria da vida das populações, trazidas pela busca egoísta da exploração desenfreada dos recursos naturais do território, refém de um feudalismo selvagem, desregulado, sem humanismo nem ética.
Sob
inúmeras formas – aguda, violenta, surda, dilacerante, tenaz – o
feudalismo em Cabinda reduziu as populações autóctones à uma pobreza
abjeta, à dependência exótica, à indigência, com a mão sempre estendida
nos dois Congos.
- A crise ambiental, não só como consequência da corrupção, da desgovernação e da falta de sentido de Estado, mas também como a resultante do modelo de exploração petrolífera, sem contrapartida para as populações locais. Esta crise começa a oferecer sinais claros de que estamos ultrapassando os limites de suportabilidade do espaço territorial, facto este visível no incremento de doenças como asma, bronquite, cancro, cólera, disenteria, gastroenterite, malária, febre tifoide, aumento de stress, ansiedade e nervosismo, dores de cabeça e de estômago, manchas e até cancro de pele.
Neste
contexto, o território de Cabinda não tirará pleno partido dos seus
enormes recursos e alcançará a paz e altos níveis de desenvolvimento
enquanto não extirpar esta doença própria a um Estado colonizado de tipo
feudal.
Ilustres Euro parlamentares, Minhas Senhoras e Meus Senhores,
É
aqui na Europa que os interesses dos lóbis do Regime angolano têm vindo
a estender os seus tentáculos. É aqui eles levam a cabo uma ofensiva
visando a ofuscar a má governação e as atrocidades do regime “en place”,
e a abafar as vozes dos ativistas sociais que nestes últimos anos se
levantam contra o atual profissionalismo político que legitima o crime
em Angola.
É chegado o tempo de agir e de optar: sempre pela positiva. É
chegado a hora de ajudar Angola a integrar o país na caminhada para
desenvolver uma verdadeira democracia pluralista. Esta batalha não é só
dos angolanos, nem é apenas das elites políticas do mundo. É batalha de
todos os cidadãos do mundo.
Como
não há um modelo único de Estado de Direito Democrático, atrevo-me a
recomendar que toda ajuda à Angola deveria permitir aos angolanos e ao
mundo sentir a organização do Estado funcionar na sua interação e
mudança contínuas, dando voz à todos os cidadãos, abordando sem tabus os
atuais dilemas e conflitos, em especial o conflito ainda reinante em
Cabinda, e posicionando-se cada vez mais no limiar da Transparência,
Justiça, Fraternidade, Reconciliação e Dignidade Humana.
Muito obrigado!
Bruxelas, 11 de janeiro de 2016
José Marcos Mavungo
Ativista dos Direitos Humanos em Cabinda
1Comunicação feita aos Euro Deputados na sala Altiero Stinelli A1E1 do Parlamento Europeu, no dia 11 de Janeiro de 2017, em Bruxelas
FIM DE DIVULGAÇÃO