MEMORANDO SOBRE AS ELEIÇÕES AOS OBSERVADORES DO PROCESSO ELEITORAL ANGOLANO

MEMORANDO SOBRE AS ELEIÇÕES
AOS OBSERVADORES DO PROCESSO ELEITORAL ANGOLANO


1. Angola está a realizar desde 1975 as suas terceiras eleições. Pela primeira vez o país poderá cumprir o prazo constitucional de realização eleitoral.

2. As primeiras eleições realizadas 17 anos após um regime de partido único, em guerra permanente, descambou numa nova guerra de mais 10 anos (1992-2002) por causa da fraude eleitoral num contexto de dois partidos políticos beligerantes e concorrentes, detendo Forças Armadas.

3. As eleições de 2008 foram consideradas como havendo registado oficialmente um conjunto enorme de “irregularidades e insuficiências” que foram consideradas fraudulentas pela maioria dos partidos concorrentes. O Relatório então elaborado pela União Europeia justifica claramente esta conclusão dos partidos e que, em condições normais, poderiam permitir a anulação do acto eleitoral. Os inquéritos mandados fazer devidos as “insuficiências e irregularidades”, sobretudo em Luanda, nunca foram publicados, mostrando interesse em omitir a realidade dos factos. Foi
notório o caso do Kwanza Norte, onde votaram mais cidadãos que o número de inscritos, apesar de ter havido em todo o espaço nacional significativa abstenção

4. Numa atitude de alto sentido de preservação duma paz, ainda fresca, os partidos da oposição não criaram qualquer dificuldade a constituição da nova Assembleia Nacional que, transformada em Assembleia Constituinte, suprimiu as eleições presidenciais e consagrou o modelo atípico de eleições gerais, com votação simultânea para o Chefe do Executivo e os legisladores.

5. Em tempo oportuno os partidos da oposição apresentaram legislação eleitoral para regulação do processo eleitoral com o intuito de ultrapassar as graves debilidades observadas no passado.

O Partido MPLA impediu que as mesmas fossem discutidas em tempo útil, criando uma situação que resultou na aprovação em tempo limite da Lei Eleitoral (Lei Orgânica das Eleições Gerais – LOEG), mas não foram aprovadas nem a Lei do Registo Eleitoral nem o Regulamento da LOEG.

6. Tal situação propositada permitiu que, contrariando a própria Constituição, o Registo eleitoral fosse organizado por uma entidade dependente do Executivo, o MAT, Ministério da Administração do Território, quando a Constituição estabelece ser o registo da competência da CNE (Comissão Nacional Eleitoral); que ao invés duma CNE “independente”, temos uma CNE partidarizada com maioria dos seus membros sendo do Partido no poder, podendo aprovar unilateralmente todas as decisões; que as eleições não sejam efetivamente universais, pois os angolanos residentes no Exterior não votam;

7. Ganhou fórum de notoriedade a perturbação causada pela eleição do Presidente da CNE. A Lei estipula que deve ser um magistrado judicial a ocupar esse cargo, mas o Conselho Superior de Magistratura Judicial, indicou a Dra. Suzana Inglês, uma advogada, para aquela posição, por concurso público liderado pela actual Presidente da CNE, Juiz Silva Neto. A oposição teve que recorrer a manifestações, pressões públicas e ausências no parlamento para exigir o cumprimento da Lei, o que fez perder 3 meses na organização das eleições pelo órgão competente e permitiu que a oposição não participasse na aprovação de certas Leis do pacote eleitoral como a Lei dos Financiamentos dos Partidos Políticos.

8. Dadas as circunstâncias, a sociedade civil não participou no debate da elaboração do pacote eleitoral, o que nas condições dum país emergente para a democracia seria uma importante mais-valia.

9. O facto de não existir um Regulamento Eleitoral permitiu ao Tribunal Constitucional (TC) elaborar critérios para avaliação de candidaturas, através de regras e formulários não aprovados por Lei, permitindo introduzir critérios subjetivos para aprovação das candidaturas. Com isso, partidos com intervenção política diária acabaram por ser afastados da corrida eleitoral, como o BD (Bloco Democrático), o PP (Partido Popular) e o PDP-ANA, sobretudo por se considerar que os eleitores apoiantes, surpreendentemente, “não constarem” no FICRE (Ficheiro do Registo Eleitoral).

Na altura em que os partidos concorreram o FICRE não estava disponível. Os partidos apresentarem fotocópias dos Cartões de Eleitores e estes, segundo o TC, não constam no Ficheiro de Registo.

As análises do BD, quanto a isto, permitiram identificar em muitos casos, que o próprio TC errou ao digitalizar a sua informação e considerou depois “inexistente no FICRE”. Entre muitos outros, são os casos do senhor Abílio Figueira Zua que tendo sido registado pelo BD como sendo do Grupo 60137, o TC considerou-o do Grupo 6013 e no Mapa foi excluído como «inexistente».

O BD escreveu nos registos que o senhor Jorge Pinto Gorge, do Kwanza Sul, tem o número de registo 60298, o TC considerou tratar-se de 602958 e deu-o como inexistente. A senhora Isabel Claudina Mongoko foi registada pelo BD com o número de Grupo 60010, o TC considerou tratar-se de 10010 e anulou a assinatura como inexistente. Agora que o FICRE está disponível o BD verifica que muitos dos subscritores das listas do BD, considerados inexistentes no “FICRE” pelo TC afinal, não apenas estão no FICRE, mas sobretudo têm local de voto previsto.

10. O TC não considerou as alegações do BD (ver anexo) sobre as dificuldades do processo e as questões legais levantadas pelo BD. Em particular, o BD apenas recebeu os fundos para realizar a sua candidatura um mês após terminado o processo de candidaturas. Muitos membros do BD
foram ameaçados de serem expulsos dos seus empregos apenas pelo simples facto de serem do BD. Várias autoridades impediram o contacto do Partido com as populações.

11. Por consequência, o processo de aprovação de candidaturas não foi transparente, nem justo.

12. A falta de abertura democrática no país fazia prever um processo eleitoral complicado. Por essa razão o BD escreveu à várias entidades do país para contribuírem, no âmbito das suas competências, o mais possível para que as eleições constituíssem um processo livre, justo e transparente. Entre elas, ao próprio Presidente da República, a quem se pediu que fosse
comedido no uso e abuso dos bens do Estado durante a campanha, abstendo-se de organizar com honras de Chefe de Estado o seu aniversário natalício, há escassos dias da realização das eleições;

para o Ministro do Interior no sentido de evitar que a Polícia tivesse um comportamento partidário e solidário para com as “milícias” e que os membros dos Serviços de Segurança não apenas deixassem de perseguir os membros da oposição, mas também deixassem de controlar o processo eleitoral das mais diversas formas;

à Ministra da Comunicação Social para equilibrar a comunicação pública para todos os partidos, evitar a manipulação e desinformação habituais;

ao Ministro do Território para instruir a cadeia de governantes para permitirem a livre actividade dos partidos políticos nessa fase decisiva. Apesar desses alertas do BD, as entidades visadas não quiseram ou não puderam agir no sentido que se impunha.

13. A campanha eleitoral, em particular, decorreu de forma desproporcional em todos os sentidos, não permitindo a justa competição. O balanço ora efectuado pelo Sindicato de Jornalistas é claro quanto a forma de actuação dos meios de comunicação social do Estado e privatizados por membros do partido no poder; os meios financeiros e materiais do Estado utilizados pelo partido no poder é descarado. As empresas públicas foram um importante suporte da sua campanha;

O controlo de todo o pessoal envolvido no controlo eleitoral, nomeadamente, nas mesas de assembleia é impressionante; as violações de prazos por parte da CNE retiram a possibilidade e o controlo do acto eleitoral por parte dos partidos políticos; O FICRE não foi auditado e os partidos políticos não testaram a coerência dos softwares.

14. Por outro lado, os partidos da oposição concorrentes como a UNITA, o PRS e a CASA-CE têm protestado insistentemente contra o não credenciamento dos seus delegados e por outras omissões da CNE, nomeadamente, a previsível ausência de actas eleitorais para os delegados e a ausência de cadernos eleitorais em “hard copy” nas respectivas mesas.

15. É entendimento da BD que estão assim criadas todas as condições para que a confusão existente em 2008 se repita.

16. A situação política em Angola desde 7 de Março de 2011 é sobretudo caracterizada pela vontade da juventude ter mais oportunidades. Para o conseguir ela tem contestado o poder permanente do Mpla nas ruas, através de manifestações. Tal posição, sempre contrariada pelo regime através
de agressões, prisões e raptos, perpetrados, inclusive, por grupos de “milícias” para-policiais, ganhou a simpatia da opinião pública. Hoje são vastos os sectores que se têm manifestado, reivindicando os seus direitos, em particular, os ex-combatentes, cujas pensões de reformas não são pagas há vários anos.

17. A percepção do BD é que o nível de consciência popular não está disponível para aceitar um processo fraudulento. Um sintoma disso são os inúmeros apelos da sociedade civil sobre as anomalias do processo eleitoral. O BD nota igual indisponibilidade da parte dos partidos políticos que entendem que a sombra da guerra não deve funcionar como factor de chantagem para tolerar golpes à democratização do país. As manchas de todo o processo não podem persistir na fase final do acto e contagem dos votos.

18. Por esta razão o BLOCO DEMOCRATICO recomenda à CNE que se criem condições credíveis, de acordo com a Lei, para normalização do processo eleitoral a fim de se assegurar a estabilidade da situação em Angola, concluindo-se com os seguintes actos, entre outros:

a. 1. Análise com auditoria do FICRE (Ficheiro Informatizado do Registo Eleitoral)
b. 2. Credenciamento correcto dos delegados dos partidos políticos
c. 3. Credenciamento dos observadores nacionais
d. 4. Publicação atempada de todos os cadernos eleitorais
e. 5. Publicação atempada da lista dos membros de mesas e seus presidentes
f. 6. Criação de condições para que as Actas sejam entregues a todos os delegados de lista
g. 7. Certeza de que o escrutínio terá a participação efectiva dos partidos políticos
h. 8. Limpeza de propaganda junto das locais de voto

19. O BD pensa ser prudente um adiamento do pleito para permitir melhor a organização e dar confiança a todos os actores relativamente ao acto eleitoral.

20. O Bloco Democrático agradece a atenção que possa ser dada às suas considerações

A COMISSÃO POLÍTICA DO BLOCO DEMOCRÁTICO, aos 30 de Agosto de 2012

PELA COMISSÃO POLÍTICA
JUSTINO PINTO DE ANDRADE
(PRESIDENTE)


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