Todos temos razão quando acreditamos em lugares-comuns e fazemos deles dogmas absolutos que nos obnibulam a análise.
Na parte dos casos, as análises políticas, sobre o país, pecam por falta de contextualização dos conceitos operatórios que utilizam.
Primeiro e principal erro, no caso das eleições de 31 de Agosto, não levam em consideração que estas eleições (como as anteriores) não se realizam em situação de liberdade (de democracia) mas de relativa permissividade da ditadura e, por isto, as considerações sobre as escolhas do eleitorado são meramente fantasiosas (mas são absolutamente legítimas como tal, isto é, no capítulo da futurologia, das apostas, dos "prognósticos") porque não são objectivamente mesuráveis porque não correspondem a essas escolhas.
Segundo, e questão central, é que expendem considerações sobre os resultados pretéritos e futuros sem levar em conta o monopólio da fraude ou a eventual capacidade de controle dos cidadãos da verdade eleitoral.
Toda e qualquer dita análise dos resultados eleitorais de 2008 é meramente risível, na medida que estes não foram decididos por lógicas políticas, por percepções, escolhas ou condicionamentos psicológicos dos eleitores mas pelo punho do ditador. (Não se lembram do caso mais escandaloso o do Kwanza-norte em que os resultados publicados pela CNE davam mais votos que eleitores?).
Hoje, não resta dúvida nenhuma que houve uma fraude monumental e que os 82,1% do partido do poder não correspondem a nenhuma realidade social ou sociológica angolana mas tão-somente à vontade do ditador que organizou uma monumental fraude, não por razões de governo mas por razões de regime pois queria dispor de maioria qualificada para mudar a Constituição e consagrar a ditadura na Constituição.
Depois são os "mitos" que surgem como lugares-comuns que se repetem, sem uma reflexão sobre a sua testificação (Propper) É o que acontece em relação ao Bloco Democrático (já antes se dizia da FpD) que tem que se tornar um partido de massas para vir a ganhar eleições ou, mesmo, para obter a sua participação em eleições.
No entanto, este mundo fora a maior parte dos partidos, são partidos de eleitores e não de militantes, configurando-se como partidos de quadros.
No caso do BD, afinal, o TC reconheceu que o BD entregou 16.571 assinaturas válidas (quando a lei obriga a entregar 14 a 15 mil assinaturas).
Há um erro que persiste é o de pensar o país como um país maioritariamente rural quando houve uma mudança demográfica que faz com que 60% dos cerca de 20 milhões de habitantes do país estejam nos centros urbanos, nomeadamente em Luanda, onde vivem mais de 6,5 milhões.
Mesmo no meio rural (40%) a concentração das populações está sobretudo nas sedes dos municípios.
Um só exemplo: a província de Benguela tem cerca de 2,2 milhões de habitantes. 1,7 milhões estão concentrados na faixa litoral (metropolitana) da Baía Farta-Benguela-Catumbela-Lobito. O resto está no interior, onde se destacam as concentrações das vilas da Ganda, do Cubal e outras sedes municipais.
Então para quê chegar "aos pontos mais recônditos de Angola", com a certeza de maiores custos (outra variável que os analistas não levam em conta. A propósito, o BD foi o único partido que não foi contemplado com os 98 mil dólares para a preparação do processo de candidatura) e baixos níveis de produtividade em termos de recolha de assinaturas e de votos?
Não se pode esquecer que há actualmente uma grande assimetria demográfica que faz com que 65% da população se concentre em cinco províncias: Luanda, Kwanza-sul, Benguela, Huambo e Huíla.
A estratégia do BD foi apostar na implantação do partido nas grandes aglomerações de população urbana, trabalhando no peri-urbano.
Há outro erro grasso, que mostra um certo desconhecimento da realidade, é pensar que a FNLA-Ngonda representa a FNLA-histórica. Esta sigla não terá senão os votos que lhe forem dados pelo ditador porque o eleitorado Fnla-histórica, legitimamente liderada por Ngola Kabango vai abster-se ou votar em branco.
No entanto, a Fnla-histórica é primeira força política na província do Zaíre, onde normalmente colocaria dois deputados nesse circulo eleitoral.
Ao me permitir fazer futurologia, se não houver verdade eleitoral, ou seja, se não se conseguir quebrar o monopólio da fraude, JES vai dispor no parlamento de 90% dos lugares distribuídos pelo MPLA, ND, FNLA-Ngonda, Papod e Fuma (que vai servir para drenar artificialmente votos ao PRS), deixando 10% para serem divididos muito assimetricamente pela Unita, pelo PRS e pela Casa que poderá também beneficiar dos esquemas anteriores, nomeadamente nas Lundas.
Desta maneira o ditador vai fazer o discurso do pluralismo e do reequilibro político, no país, ao mesmo tempo que consolida ainda mais o seu poder, ao nível institucional. A erosão do poder virá então da rua!
Nelson Pestana Bonavena